Nos últimos anos, um pouco por todo o mundo, temos vindo a assistir ao aumento do número e da popularidade dos partidos de extrema-direita. Estes movimentos conservadores defendem, entre outros ideais, a família tradicional com os rótulos já conhecidos: o marido homem, que traz o sustento necessário a casa oriundo do seu trabalho árduo, e a esposa mulher, que é doméstica e encarregada de educar os filhos. Apesar de muitas cidadãs caírem na armadilha de considerar que a família tradicional é o melhor exemplo para a sociedade atual seguir, as implicações destes retrocessos seriam amplamente sentidas por todos em vários aspetos. Seriam reais e graves.
Se as mulheres extremamente conservadoras em cargos de poder vissem o que proclamam ser aplicado dentro dos seus lares, provavelmente ficariam fechadas em casa o resto das suas vidas, agarradas aos filhos e às tarefas domésticas, desprovidas da liberdade de expressão de que tanto tiram proveito e com direito a uma eventual agressão física por parte do cônjuge de vez em quando. Os dados relativos à violência contra as mulheres são explícitos e tendem a crescer ano após ano. Em 2024, a APAV apoiou 11.993 vítimas de violência doméstica e foram registadas 543 violações em Portugal.
Do mesmo modo, também o discurso machista online tem vindo a aumentar, e é posto em prática por influencers cujo público-alvo é constituído, na sua maioria, por jovens rapazes, que se tornam apoiadores destas convicções e, por consequência, namorados e maridos abusivos, que diminuem a imagem da mulher a um ser fraco e frágil sob o qual têm domínio. Em simultâneo, ao invés de assistirmos ao reforço de políticas que salvaguardem a igualdade de género, presenciámos recentemente a revogação da Roe v. Wade nos Estados Unidos da América, que retirou a proteção federal ao direito ao aborto, assim como a criação de várias leis antiaborto e “anti-género” pela Europa fora. E tudo isto parece ser aceite pela sociedade, inclusive por algumas mulheres.
Um caso que está a ser bastante discutido nos media neste momento são os polémicos anúncios publicitários gravados pela atriz norte-americana Sidney Sweeney para a marca American Eagle, em que se alega que “Sidney Sweeney has great jeans”, fazendo um trocadilho entre as palavras jeans e genes, devido à aparência da atriz. Durante todos os anúncios divulgados, é também notória a tentativa de sexualizar ao máximo a jovem, que fala com um tom provocador e chega a posar deitada. É assim que as mulheres de hoje em dia pretendem ser vistas? Porque voamos a implorar para sermos colocadas de novo numa gaiola?
O mundo precisa de respeitar as mulheres e não de as desvalorizar. A economia e a segurança social entrariam em crise com a redução da presença feminina no mercado de trabalho e na atividade económica, bem como na ciência e na produtividade das empresas. Somos mais do que reprodutoras: somos agentes capazes de inovar, erguer a nossa voz, demonstrar as nossas competências e levar avante os nossos projetos. É urgente dar a volta à realidade que temos vindo a observar. Não podemos deixar cair por terra a luta que as nossas antepassadas travaram durante toda a sua vida, e devemos admitir que é ridículo e até vergonhoso que, hoje em dia, se ponha em causa a hipótese de as nossas filhas não terem acesso aos direitos que nós temos.
É preciso agir – erguer a voz, enfrentar os extremistas e impedir que apaguem décadas de conquistas. O feminismo não é sobre superioridade, é sobre igualdade, e jamais pode ser encarado como uma bandeira woke desprovida de importância. Não podemos fazer uma pausa a meio da corrida, mesmo que a meta esteja próxima – nunca se sabe que não acabamos como a lebre.
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